Caro leitor, um poeta toca a sua porta. Vá atendê-lo porque ele chega com Reflexos Interiores, estréia que cataloga pelo menos quatro vertentes de sua atividade. A que fica mais evidente desde o início do volume é a lírica amorosa.
Nela, Thiago Maerki encena um romantismo melífluo, declarando amores em versos como os de “Amar é melhor que tudo”. Mas também se aventura, no que obtém melhor resultado, em observações à la cinematógrafo parnasiano. Assim, interessa ler “A mulher no banho” e “A mulher no banho II” como versões contemporâneas ou paródias de certos poemas eróticos de Luís Delfino, Carvalho Júnior e Olavo Bilac.
Levar o poema a tematizar a própria confecção é dos lugares chaves da arte poética. Mas a partir dos séculos XIX e XX, o procedimento intensificou-se na lírica a ponto de virar quase conditio sine qua non do poeta. O artista quer a toda hora testar seu ofício, à medida que foi se tornando rotina a quebra de paradigmas poéticos, de sistemas filosóficos e religiosos. Mesmo a posição social do poeta perdeu claridade para romancistas, cancionistas e cineastas. A meta-poesia, por assim dizer, surge hoje como resposta ao mutismo geral reservado aos poetas. Em “Co-poeta”, Thiago chega a nos convidar para a co-autoria, em versos que operam como o desenho a ser preenchido pela criança aprendiz.
Uma terceira vertente é o cotidiano. Em “Superstições” e “Coisas de menino” recobra-se a tradição oswaldiana de olhar para a rua com aquele espanto da primeira vez. Mas Thiago pouco se dedica a essa possibilidade, justamente porque sua preferência recai sobre a poesia didática. Aqui se encontra sempre à vontade para discutir matérias grandiosas (“Vida efêmera” e “O nada é algo”), ou a tratar diretamente com filósofos do naipe de Heráclito ou Platão. Do ponto de vista do assunto, Maerki sabe o que busca. Seguidor de Lucrécio, poeta latino apontado como um dos pais do gênero didático, deseja filosofar em versos, isto é, transpor para a linguagem agradável os raciocínios áridos. No futuro, o desafio será chegar a uma forma poética que responda a tamanho intento. Dominar o soneto, essa técnica parenta do silogismo por hora apenas experimentada, talvez seja seu próximo passo.
(Prefácio a Reflexos Interiores [2009], Thiago Maerki.)
Por Pedro Marques
31 jul. 2010