Leitura
da plateia, um silêncio incondicional
à leitura magnífica do poema.
sem tê-lo em mãos, roubo-lhe, com os olhos,
em outras mãos na cadeira à frente.
cada palavra, como um gato manso
que rodeia e amacia o próprio sono,
fluía a intensificar o pensamento.
quando então um vocábulo se quebra:
– sou- …
(souvenir? souvent? soutien-gorge?) –
e o poema, então só lisonjas, acabou-se para mim.
porém, sensual e divinamente, à frente de
meus olhos, surgia um outro poema: os ombros
daquela que mantinha o poema em mãos.
desta vez, não havia música como queria Verlaine,
mas silêncio e temperatura, onde o contorno, um balé
crayon, como num desenho perfeito, comia o cosmo.
as pintas (duas? sete? quem sabe dezenove?):
pequenas ilhas de desordem no oceano da razão.
quando a leitura findou-se e o desespero dos
sentidos foi sufocado pelos aplausos,
um incêndio na carne acordou todos os arrepios,
e, passado este outro poema, acordado de um sonho
que sonhara dentro de outro (there must have
been magic), pensava na nobreza da vida
e de que maneira o outono criava tais anjos.
*Fabiano Calixto_ 1973-_Sanguínea_2007