o choro do palhaço
II
Não posso mais morgar nesse mormaço,
não sei se morro logo ou se me arranco;
quero explodir de rir com estardalhaço,
quero matar ou assaltar um banco.
Se um dia me foder inda me manco,
mereço cometer um erro crasso:
broxar pra todo o sempre, ficar manco,
perder uma mulher, quem sabe um braço…
O que pintar na minha estrada eu traço,
se o carro der o prego, vai no tranco
e eu me aguento a cada solavanco
dos atravancos de por onde passo.
Não sei se negligente ou se devasso,
vou meter esse carro num barranco;
o risco que eu corro eu mesmo banco
e a flor da juventude pede amasso.
Vou mal do fígado e talvez do baço,
quero desopilar o que retranco;
não sou Florbela, mas também espanco
e, agora, canto o choro do palhaço!
*João Miguel Moreira Auto_1974-_Mausoléu_2009