260º Poema da Semana | 01mar2021

Aos 50

(…)
e foi ligar na tomada que o som encheu a casa
até o
quintal.
a música
escoria pelas paredes,
eu jurava que via a música escorrer
mas pensei que estava ficando
sozinha demais e começava a inventar distrações
mentais parecidas com loucura.
coloquei Nat King Cole
um dia
sentei no banco do ex-morador generoso
pra ouvir, o Vento sumido,
o vinil do Nat no lado A com ele cantando em inglês.
no lado B,
espanhol.
o ouvido no inglês me distraiu tentando entender
uma língua que não sei muito bem. se eu fosse
aeromoça teria que saber pra conversar com
os gringos,
estudaria muito
até que eles me dissessem:

– are you from brazil?

abismados.
ficou silêncio de fim de disco
só com o chiado
da agulha e eu
imersa tomando vinho de mercado mesmo, gelado de
geladeira completamente fora da temperatura
ideal, mas
era um vinho, afinal de contas,
e era
domingo, as paredes azuis o céu também.
foi então que Nat
começou a cantar

cachito,
cachito, cachito
mio
pedazo de cielo que dios me
dio
(…)

*Aline Bei_1987-_O peso do pássaro morto_2017