296º Poema da Semana | 04abr2022

O bêbado

(…) O pai é erguido da lama pelos cabelos no meio da rua. Os punhos estão algemados. O soco no estômago faz o corpo se encolher para a frente. Junta os braços sobre a barriga em uma tentativa de se proteger, conter a dor. A cabeça se inclina ainda mais. O golpe de joelho atinge em cheio o nariz, lança a cabeça bruscamente para cima. A visão é terrível para o filho Alessandro, de 8 anos, que tem os olhos grudados no buraco da velha porta de ferro do galpão. O menino morde os lábios, aperta os dedos das mãos. Torce chorando por Zezinho, o pai, que não consegue escapar da violência. O homem ainda tenta se equilibrar. Dá dois passos para a frente, um para o lado. As pernas amolecem. É agarrado por trás, pelo cinto, pela gola da camisa. Um empurrão joga-o para o meio da roda formada pelos agressores. Ao cair de bruços sobre um pneu abandonado no barro, o pai sai do ângulo de visão de Alessandro, que pede a interferência da mãe:
— Temos que fazer alguma coisa, mãe. Chame a polícia…
— Eles são a polícia, filho — cochicha a mãe, Maria Aparecida, também espiando a agressão. (…)

*Caco Barcellos_1950-_Rota 66: a história da polícia que mata_1992