Sonantes repugnetos: uma croa roída

1# Ascaris lumbricoides

Barriga da República, o que esconde
por entre o cipoal desse intestino?
Por traz desse tanquinho, bem aonde
fermenta, de verdade, seu destino?

“Os donos, dos políticos em bonde,
investem numa gente sem refino,
ascosa travestida de visconde,
o títere que crê que é o bailarino.”

São eles a doença do seu Estado,
são eles a miséria que governa
seu tempo, do futuro até o passado?

“Falando o papo reto, tal baderna
é o meio do bosteiro desatado,
spaghetti de Lombriga que me inferna.”

 

2# Trypanosoma cruzi

Então, no coração da governança,
habita algum chupim quase invisível?
O gen que se distingue por herança,
o dono do universo e do impossível?

“Você cantando assim, a coisa dança,
Poeta que embeleza até o horrível;
porém, aqui se trata de vingança,
um rei que odeia o súdito, insensível.”

Por que, se quem trabalha nesta terra,
se quem prepara a festa da fartura,
é o corpo mestiçado que se ferra?

“Por isso mesmo, o rico não atura
aquele que espreguiça o que o aterra,
o Mal de Chagas chupa quem o cura.”

 

3# Streptococcus mutans

Acaso a sua lei não respira o belo
sonhando a sociedade em harmonia?
A crença na justiça do martelo
batendo o mal pra fora da Utopia?

“De fato, se morasse no castelo
alguma elite fã de sinfonia,
não sendo da ciência o vil flagelo,
nem tendo como meta a regalia…”

É certo que essa boca não mastiga
o coco que lhe servem e nem escova
o dente que, amarelo, me fustiga.

“Boquinha de juiz parece cova,
do réu e da denúncia é a formiga,
a Cárie que apodrece toda prova.”

(…)

(Revista Morus – Utopia e Renascimento, 07/2018. On-line: http://www.revistamorus.com.br/index.php/morus/article/view/346/318)

Por Pedro Marques
21 ago. 2019