255º Poema da Semana | 25jan2021

O candidato sem sorte

I
Certa vez eu inventei
De sê pulítico do povo
Pruquê eu sempre gostei
De fazê argo de novo
Eu pensei se fô eleito
Vereadô ou prefeito
Vai ter que me ajudá
Do jeito que sou jeitoso
Oxente! Eu fico famoso
Sem percisá istudá

II
Aí fui no deretóro
Me afiliei ao partido
Falei cum cumpade Onóro
Que é um caboco sabido
Pois pá isso é necessáro
Sê tê um bom secretáro
Desses caba perparado
Qui pras coisa leve jeito
Pá fazê tudo dereito
Sem nada sair errado

III
Dixe: – Tome as providença
Me arranje o que fô perciso
Sem temê a disavença
Nem incará prejuízo
Mande fazê os retrato
Pode ispaiá o buato
Aí im todo setô
E u islogan da coisa era
Vote em Mané de Quitéra
Mode sê vereadô

IV
Danei-me a gastá dinhero
Dando xarope, meizinha
Cama, colchão, travissero
Arroz, feijão e farinha
Era o qui o povo pidia
Gente de noite e di dia
Ia pidí as coisa a eu
Quando os caba me avistava
Logo de longe gritava
– Seu Mané! Meu voto é seu

V
E nessa situação
Munto dinhero gastei
Mas no dia da inleição
Apois num é que ganhei?
Aí munto satisfeito
Pensei já qui fui eleito
As coisa vão miorá
Meu gado agora tem pasto
E tudo quanto foi gasto
Sei que vou recuperá

VI
Pensano nessa miora
Cheguei em casa risonho
Dixe pá muié agora
Realizei o meu sonho
Mas quá! Eu tava inucente
Pegô foi chegá mais gente
Pidino sem ter priguiça
Era de noite e di dia
Homi, aquilo paricia
Uns arubú na carniça

VII
Chegava um me falano
Ói! Eu sô seu inleitô
E agora to percisano
Uma ajudinha do sinhô
Uns 3 saco de cimento
U’a sela pá meu jumento
U’a ropa pá Mané meu
Um chinelo pra Anacreta
E pá minha bicicreta
Cama de á e pineu

VIII
Oto chegava dizeno
Ói! Seu Mané, eu votei
E agora eu tô quereno
Aquilo que lhe falei
Tá lembrado, seu Mané?
Que eu vim com minha muié
E o sinhô me deu um chão
E dixe que eu aguardasse
Qui quando o sinhô ganhasse
Nós fazia a construção?

IX
Pois taquí o orçamento
Quero 30 mil tijolo
20 saco de cimento
Mais duas porta de rolo
Peda, cá, cerâmica, areia
Ferro, prego, arame, teia
Tinta a óleo pá pintura
A madera, um carpintero
E us 4 ou 5 pedrero
Daqueles da prefeitura

X
Eu mode num fazê fei
Todo momento atendia
Tudo que tinha gastei
Cum us povo qui mi pidia
Imendei na confiança
Uns trocado da poupança
Qui inté era mei graúdo
Vindí casa, terra, gado
O ligume do roçado
O povo lambero tudo

XI
Fiquei quase na misera
Vivendo do ordenado
Pobi Mané de Quitéra
Ganhou mais ficou lascado
É assim que o povo diz
E eu aqui munto infeliz
Morrendo com tanto “arroxo”
Infeliz pruquê ganhei
E só num já renunciei
Mode num passá pru froxo

XII
Só vou findar o mandato
Pruquê não tem outro jeito
Mais num vou ser candidato
Nem pá mode sê prefeito
Já disse a minha muié
O satanás é quem qué
Entrar nessa besta-fera
Qui só me deu sacrifiço
O diabo é quem quer mais isso
Mas não Mané de Quitéra

*Asa Branca do Ceará_1941-_O Candidato Sem Sorte e o Santo Foi o Culpado_2015