Maria
II
Num açougue no fundo do mercado,
Fazia já três anos que Maria
Suportava o que só suportaria
Alguém com seu destino malfadado.
A cada vez que vinha do seu lado
O seu supervisor, Maria ouvia
Alguma troça, alguma baixaria,
Ou tinha o corpo súbito apalpado.
Os seus colegas, uns achavam graça
De ver alguém tratada como escrava;
Outros queixavam sem ser escutados;
Porém, a maioria, na desgraça,
Fingia que não via e se ocupava
Cortando bifes, embalando o gado.
*Leonardo Antunes_1983-_João e Maria: dúplice coroa de sonetos fúnebres_2017