223º Poema da Semana | 19ago2019

Cacau de Leviatã

Leviatã quer cacau
pra comprar o seu palácio;
quer depois tantas arrobas
pra fazer a eleição;

quer cacau, quer cacau,
quer agora – e se babuja:
quer cacau para o fomento
do cacau com que se suja.

E depois de fomentado
o cacau, esse mostrengo
talvez de cacau precise
para a crise do cacau

que um vento mau criou
de modo poligonal…
(Mas lamenta muito em nota
esse gênio casual.)

Que fazer? Tomar um porre,
sim, de licor de cacau:
bem daquele que escorre,
tal se mel artesanal

do cacau deitado em folhas
de bananeira, em quintal;
mas se um bicho morde ou mija,
é dos seus e sabe qual.

Com ressaca dessa crise,
pede água mineral.
(O bicho, mata esfolado
de modo bem natural.)

Mais eis que inventa contrato
(duro em cláusula penal)
de juros – baixos! – que dá
o bom Levi, ao cacau.

Levanta logo a hipoteca,
mal chegado o termo tal;
engole enfim a fazenda,
os alugados, canção

que vinha do pisoteio.
Sobra um pouco de cacau?
Lambe os dedos, lambe os dedos:
Quem não trouxe o meu rural?

– mas só fala do imposto…
Traz aí, que faço gosto,
minha fome é sem igual.
E se vira agora o rosto,

quer o inventado cacau.

*Wladimir Saldanha_1977-_Cacau inventado_2015