107º Poema da Semana | 30abr2014

 

Felisberta era uma mulher de força. Acompanhou a morte de cada marido daquele jeito de sempre, sóbria, alerta. No baú da sala, depositava o que considerava a memória de cada um. Os olhos de Adamaceno, os restos de Urbano, as moelas de Rufino, o troço do Roberto. Acordava ainda de noite. Cortava rentes as rodelas de cenoura, para depois jogá-las no guisado. O almoço depois da missa na tevê. A tarde inteira remoía-se em memórias, sentadinha, no canto direito do sofá. Precisava ir. Buscar um pãozinho. Não foi.

*Marcio Dal Rio_1973-_Transitivos Balada Improvável_2011